Estava pensando em escrever algo sobre o filme " O mistério do Samba ". Para ser sincero, não gostei, por motivos particulares. Eis que entro às 3 da madruga, depois de mais uma noite inteira ao lado do meu inseparável amigo
Allan, acesso o blog do Terreiro Grande e dou de cara com um magnífico texto de outro grande amigo: Renato Martins.
Me identifiquei tanto com a crítica, literalmente falando, que tomei a liberdade de publicá-la por aqui também. - Alô
parceirinho, sou teu fã número um!Aì vai o texto:
" Esse é o mistério do samba?

Não pretendo entrar no mérito do filme, nem sobre sua qualidade técnica ou nada disso. Mas, sobre o título do filme, que nos levanta questões relevantes.
Em entrevistas sobre o documentário, seus autores e a cantora Marisa Monte, muito falaram sobre a
idéia do filme e as questões que ele trazia à tona. Uma delas, o título do filme, chamou-me a atenção.
"O Mistério do Samba". Eis o que diz a cantora Marisa Monte, com relação a isso:
"
A gente não quis fazer algo muito biográfico, queríamos mostrar como os sambas "brotam" desses sambistas que têm um cotidiano cheio de valores fortes, e às vezes muito duro. Como aquilo se transforma em música altamente sofisticada, mesmo eles não sendo músicos profissionais? Esse é um dos mistérios do samba", disse Marisa.
O samba tem uma porção de mistérios. Muitos, de fato. Mas, acredito que esse não seja um deles. Por que é um mistério que sambas geniais, magníficos, obras
espetaculares e personagens incríveis, nasçam de
cotidianos "às vezes muito duro"? Qual é o mistério aí? A sofisticação, quando vinda dessa gente pobre, analfabeta, muitas vezes, sem a tal "cultura" formal
acadêmica, é mistério por que? Mistério pra quem? Desde quando se mede sofisticação, pelo grau de intelectualidade ou pela especialização musical? Desde quando a música, pra ser sincera, boa, sofisticada, precisa disso? Ou seja, o mistério é: como essa gente pobre, de vida difícil, consegue fazer músicas sofisticadas? É isso o que o filme pretende mostrar. E isso é uma pena.
Penso que essa argumentação, esse pensamento, é
preconceituoso e simplista demais. Como aquele cara que diz: "Ah, o Cartola é um
gênio, e se pensar que ele é
semi-analfabeto, então... nossa!" Como se isso, o diploma
acadêmico, ou a quantidade de livros lidos, respondessem às questões todas da vida, que todo ser-humano é capaz de pensar e falar sobre, sendo ele letrado ou não. Balela! Preconceito puro! E como se o Cartola, ou o Chico Santana, ou o
Alvaiade, ou qualquer outro
gênio, misteriosamente tornou-se
gênio num passe de mágica. Um dia, pintando parede, ou lavando um carro, pronto, nasceu o "Hino da Portela". Isso é mais que preconceito. Isso é diminuir o valor da obra e do autor, e todo o trabalho que ele teve pra fazer algo bonito, sofisticado. Não foi por acaso que o
Villa Lobos não fez nenhum samba de terreiro, assim como não foi por acaso que o Paulo da Portela não escreveu nenhum concerto para orquestra. Discordo radicalmente dessa opinião simplista. Me recuso a aceitar que o mistério do samba seja esse. Não é esse. Nem ninguém sabe qual é.
O que eu sei, é que esse jeito europeu, medieval, de pensar, já tá mais que na hora de mudar.
E afinal, que diabos é sofisticação musical?
Abração! "
Perfeito
Reninha, perfeito...